MARCINHO VP PEDE TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL QUE O CONDENOU A 36 ANOSO Supremo Tribunal Federal recebeu pedido de Habeas Corpus (HC 95281) de Márcio Santos Nepomuceno, conhecido como Marcinho VP. Ele foi condenado no ano passado a 36 anos de reclusão, em regime inicial fechado, por ter encomendado a morte de André Jorge (Dequinha) e Rubem Andrade (Rubinho), em 1996.
A defesa sustenta que há falhas no processo que condenou Marcinho VP, apontado pelo Ministério Público como um dos líderes do tráfico de drogas do Complexo do Alemão, um conjunto de favelas da cidade do Rio de Janeiro. Os advogados contestam que Marcinho tenha ordenado o esquartejamento das vítimas, um método cruel qualificador da pena. Eles também negam o suposto motivo de VP nos homicídios porque, conforme a acusação, os dois homens mortos seriam associados a um traficante rival. A defesa alega que o rival estaria morto desde 1994 e, portanto, não poderia estar brigando pelo controle do tráfico no Complexo do Alemão dois anos depois da própria morte.
Os advogados apontam que o julgamento do Tribunal do Júri conteria erros processuais, como falta de ampla defesa, do contraditório, do devido processo legal e do cumprimento da vontade soberana dos jurados. Argumentam, também, que o julgamento de Marcinho VP extrapolou o que havia na denúncia e que não há provas concretas da participação dele nos crimes.
Assim, os advogados pedem o trancamento da ação penal por falta de justa causa ou, de forma alternativa, a anulação da sentença condenatória. A defesa pede também nulidade pela incidência da continuidade dos delitos para a fixação da pena e, por fim, que Marcinho VP aguarde em liberdade o trânsito em julgado de uma eventual condenação.
COMENTÁRIO
No caso em comento, o paciente do HC impetrado perante o STF foi condenado a 36 anos de reclusão pela prática do que a doutrina chama de homicídio mercenário. Trata-se de figura típica prevista no artigo 121, § 2º do CP que dispõe:
Art. 121 - Matar alguém:
§ 2º - Se o homicídio é cometido:
I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe.
Do que se vê, estamos diante de hipótese de homicídio qualificado, em razão da torpeza (motivo torpe), modalidade essa, que exige, necessariamente, a participação de duas pessoas - o mandante e o executor. O primeiro, faz uso de terceira pessoa (executor), para garantir a sua impunidade. Trata-se, assim, de crime de concurso necessário (plurissubjetivo).
Note-se que, para a incidência dessa qualificadora, o legislador penal não exigiu que haja efetivo pagamento, ou, que a promessa se cumpra. É suficiente que esse seja o motivo do crime. Nesse momento, uma indagação se impõe. A qualificadora em comento se comunica a ambos, ou alcança somente o executor?
Um tema que divide a doutrina. Para responder a tal indagação, é indispensável que se analise a natureza dessa qualificadora. Em outras palavras, se se trata de circunstância objetiva, subjetiva, ou de elementar do tipo, nos termos do artigo 30 do CP ("não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime").
A maioria da doutrina defende a sua natureza de elementar comunicável, alcançando, assim, tanto o executor (que recebe para praticar o crime), como o mandante do crime, que o remunera. Essa é a posição, por exemplo, de Mirabete.
Em contrapartida, Heleno Fragoso, filiando-se à doutrina mais moderna entende que se trata de qualificadora incomunicável, em razão do seu caráter subjetivo, uma vez que se relaciona com o motivo do crime.
Essa é uma das teses apresentadas pela defesa do acusado para o trancamento da ação penal.
Segundo os advogados não há provas de que o acusado foi o mandante do crime, o que justificaria o trancamento da ação por falta de justa causa.
Mas, o que seria justa causa?
Para a doutrina moderna, trata-se da quarta condição genérica da ação penal, ao lado da possibilidade jurídica do pedido, da legitimidade ad causam e do interesse de agir. Entende-se que a ação somente pode ter início quando houver o mínimo de prova (materialidade e indícios de autoria).
Outro ponto a ser observado é a formulação de pedidos alternativos. O primeiro pedido formulado pela defesa foi o trancamento da ação penal.
Há de se notar que, o trancamento da ação penal por falta de justa causa somente é possível se houver comprovação, de plano, da atipicidade da conduta, da incidência de causa de extinção da punibilidade ou da ausência de indícios de autoria ou de prova sobre a materialidade do delito. Não existindo a prova, tal medida não é cabível.
Prevendo a possibilidade de o magistrado negar o trancamento da ação, por entender existir indícios da autoria, a defesa pleiteou a anulação da sentença condenatória, sob o fundamento de ofensa aos princípios constitucionais da ampla defesa, do contraditório e da soberania do veredicto dos jurados. Diante da probabilidade de ter esse pedido negado, diligenciou pelo reconhecimento da continuidade delitiva (crime continuado), e, por fim, a liberdade do acusado até o trânsito em julgado da sentença condenatória.
fonte: http://www.stf.gov.br